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sexta-feira, 11 de março de 2011

Doce Ariana - Emoções Reais e Virtuais

Doce Ariana
Capítulo I
Não sei por que às vezes o barulho do mar é mais forte em relação ao barulho da onda anterior. Fico pensando se ele quer me dizer algo ou está bravo mesmo. Quero muito aprender sobre o mar. Estou tentando há um ano, desde o fatídico dia que a Fabiana me falou com voz certeira a palavra "acabou". Disse várias vezes para eu não ter dúvidas. Eu tentei discutir a relação, mas só vinha a palavra "acabou". Parecia criança quando aprende uma palavra. Uns dizem que eu fugi. Outros não dizem nada, mas o certo é que vim parar em um apartamento abandonado da minha família a beira do mar. É um local curioso. Durante 10 meses é uma cidade fantasma. Eu grito bem alto quando caminho a beira do mar e ninguém me escuta. Outro dia pensei ouvir a voz da Iemanjá me respondendo. Nos outros dois meses isto vira um vulcão furioso cuspindo gente de todas as idades, raça, credo, um verdadeiro final dos tempos. Não sobra nada nas lojas e mercados. Sobra muito coisa é no mar. Ele devolve tudo, não sei para quem. Ainda vou descobrir. Há muito tempo não morava sozinha. Muito tempo mesmo. Desde aquela fase de Rio de Janeiro que também foi dureza. Foram dois anos. Solidão total. Mas, daquela eu escapei. E dai tudo girou rapidamente, conheci Leila, signo de peixes, que foi uma paixão de derrubar avisos e placas. Como veio, partiu. Ficou uma louca amizade no lugar. Depois, aí sim, chegou Fabiana. Não parecia coisa para durar - durou e muito.
Tenho dois amigos que estão tentando me segurar desde aqueles dias que vivi morrendo de peninha de mim. Eles vieram me visitar e me disseram: "não, você não pode ficar assim tão sozinha. Tem que entrar em alguma rede virtual de relacionamentos". Eles fizeram questão de me enviar o link da comunidade que eles achavam muito segura. Obediente, entrei. Um verdadeiro aprendizado. Como se escolhe alguém para fazer amizade? Pela foto? São fotos verdadeiras? São pessoas reais? Minha dificuldade não é com a tecnologia. Em tempos de juventude fui programadora de computador de grande porte. Grande porte, não, imenso porte. Depois, passei por tudo, desde o início do pequeno porte até o minúsculo porte do Iphone. Estou chegando aos 60 anos. O que me assusta é o mundo virtual. Tento colocar que meus sonhos são virtuais também para me movimentar melhor nos refúgios cibernéticos. Nos meus sonhos o outro existe, mas não tão parecido com o real como no mundo virtual. Abstrair o outro é que é a minha dificuldade.
A pressão externa quando se termina um relacionamento é angustiante. Todos sabem de tudo e todos têm conselhos a dar. O cerne da questão da voz do povo é que eu tinha que arranjar uma namorada, seja lá quem fosse. O pior disso tudo, é que eu também comecei a acreditar nisso. Até meu amigo do planalto, o Caio, quando aparecia por aqui, dizia: "temos que desencalhar nossa amiga". Aí eu comecei a imaginar a minha namorada: seria Julia, sempre quis esse nome. Remetia a um filme que vi com Jane Fonda e Vanessa Redgrave. Não podia ser loira, queria um pouco mais para morena, assim com cabelos pretos e prateados. Prateados porque a minha Julia teria mais de 60 anos - sessenta e dois estavam de bom tamanho. Quanto à altura não tinha muitas exigências, podia ser alta, baixa, mediana. Se fosse do meu tamanho, melhor ainda, embora, pensando bem, ter namorada alta sempre ajuda na hora de pegar alguma coisa no armário da cozinha. Poderia até mesmo trazer algumas pequenas gorduras na cintura, característica da idade. Agora, Julia teria que ser uma intelectual. Não precisava ser uma intelectual como Simone Beauvoir, mas que pelo menos conhecesse Hannah Arendt. Quem sabe Julia seria uma professora de filosofia da USP. Ou quem sabe alguém doutora em filologia. Ou semiótica? Se falasse francês, então... Se Julia viesse da PUC, seria bom também, mas da Filosofia. Não gostaria muito que fosse da educação. Bobagem, eu aceitaria também.
Entrei no tal site recomendado por Abel e Pedro. Logo que se entra só aparecem as fotos escolhidas a dedo. Depois quando você procura, não localiza mais ninguém. Meu engano foi pensar que funcionaria meio parecido com meu tempo de criança no jardim da praça da cidadezinha do interior paulista. Os rapazes rodavam de um lado e as moças do outro.  Depois era uma piscadinha e pronto. Já desenrolava um namoro. Também pensei que poderia ser como no tempo das baladas quando assumi para o mundo minhas preferências. Ficava no barzinho só nas flechas. Quando acertava já rolava beijo. O mundo virtual é virtual mesmo. E eu me atirei de cabeça. Nem usei codinome. Para começar, separei três pessoas...

6 comentários:

  1. Amei. Não que eu esteja me achando, mas parecia que era eu que estava escrevendo isso ai. Voarei com você. Como os gansos. O ganso é uma ave aquática aparentada ao pato e ao cisne. A escolha certa de migrar é muito importante para os gansos. Voam em formação isso permite que os gansos vejam uns aos outros e reajam rapidamente caso o lider mude de direção, velocidade e altitude. Os gansos são monógamos, isto é, só tem um parceiro a vida toda. Bjs

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  2. olá... me chamo elaine e senti muita afinidade com tua escrita. tenho 29 anos e cansei do mundo gay, alias nunca me preencheu. mas ultimamente tenho o especialmente achado pobre, cheio de tatuagens, ícones, baladas, mas se torcer tudo isso, não sai nenhum encontro humano, nenhum noite que valha a eternidade. gostaria que conhecesse o orquideadepelo.blogspot.com. talvez também sinta ali, um encontro, como senti. muito do coração, elaine.

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  3. Olá Elaine, será que essa é uma característica do mundo gay ou do mundo de hoje?

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  4. É, mas o virtual qdo é confrontado como a realidade pode nos surpreender... e muito. Grande parte do romantismo que desapareceu nos últimos tempos, retorna. É como se o virtual fosse o piscar de olhos, o flerte, a paquera escondida...
    Voltarei sempre aqui...
    Um abraço!

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  5. Leio o Tertúlia das tias no "Parada Lésbica", e gosto muito, na verdade é a única coluna que leio com assiduidade. Olhando seu perfil encontrei o endereço do seu blog. Devo adimitir, tão bom quanto! Bom, sou da área da Filosofia e das Artes e sempre gosto de conhecer pessoas interessantes, por esse motivo, acho que poderíamos ter uma amizade virtual.O que me dizes? Bjs

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  6. Separação não é fácil. Estou passando por isso e, mesmo tendo findado o amor, o tesão, ficou a vontade de estar perto, ter alguém pra conversar. Fiquei meio que perdida... . Nossa, como está difícil encontrar alguém com quem se possa conversar. Essa coisa de “bate papo” virtual, pra mim, não dá. Acho frio, distante, sem a coisa gostosa de “olho no olho”. Imagine..., com 55 anos, estou ficando uma senhorinha chata pra caramba, não muito chegada a papo furado. Jogar conversa fora é bom, mas só de vez em quando. Sou ariana, um gênio do cão rsrs..., sem paciência pra frivolidades, e hoje em dia parece que sobra gente supérflua, fútil, superficial. Às vezes me pergunto se eu é que sou muito exigente ou se as pessoas é que ficaram banais demais. E é verdade, as pessoas cobram, e como cobram, como se tivéssemos a obrigação, o dever de ter alguém do lado. Eu quero, mas não saio por aí, feito uma maluca, procurando e buscando qualquer riscado. Quando a encontrar, vou sorrir, então saberei que “é ela”. Sorrir é tudo de bom.

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